terça-feira, 26 de abril de 2011

Prócris e Céfalo, a infidelidade fatal



Prócris era casada com o Rei Céfalo da Tessália. Amavam-se com profunda ternura, porém sua felicidade terminou quando Eos, deusa da aurora de dedos cor-de-rosa, apaixonou-se por Céfalo e raptou-o para que vivesse ao seu lado. Apesar de toda a sua beleza, ela não conseguiu conquistar o amor de Céfalo. Por fim, perdendo as esperanças, consentiu que ele retornasse para viver com a esposa.

No entanto, sentindo-se abandonada pelo amante, Eos sugeriu que a sua esposa Prócris teria um amante e aconselhou a
Céfalo de se disfarçar em um rico mercador e tentar seduzir Prócris com ricos presentes, prometendo-lhes muitos outros presentes caso ela se entregasse a ele. Assim colocaria à prova a fidelidade da esposa e mostraria o quanto os homens são crédulos e ingênuos.

A princípio Céfalo relutou mas disfarçou-se e fez a corte a Prócris com tanto êxito que afinal ela lhe prometeu ser sua.
Nesse momento Céfalo arrancou furioso o disfarce revelando sua identidade, concordando com tudo que lhe havia dito Eos: todas as mulheres são infiéis e os homens são fáceis de enganar. Prócris ficou envergonhada e se exilou em outro país, abandonando Céfalo a seus tristes pensamentos.

Passado algum
tempo, Prócris conquistou os favores da deusa Ártemis, que lhe presenteou com uma lança que nunca falhava o alvo e um cão que nunca deixava de trazer a sua presa. De posse desses bens preciosos voltou com um disfarce à sua casa e Céfalo não a reconheceu. Vendo que o dardo nunca errava o alvo, voltando às mãos de quem o lançava e do cão que sempre trazia a caça a seu dono, Céfalo sentiu ardente desejo de possuí-los. Tentando obtê-los, ofereceu sua prata e seu ouro em troca, mas Prócris desprezou o pagamento; em troca exigiu que Céfalo jurasse que nunca amou sua esposa infiel, que a tinha esquecido e ficaria com ela.

Céfalo recusava a cometer o perjúrio, mas desejava tanto a lança e o cão de caça que acabou jurando.
Prócris retirou o disfarce e mostrou a Céfalo como era frágil a sedução em função de um desejo ou de um interesse. E sendo ambos culpados, ela propôs que eles esquecessem o passado, renovassem os votos de amor para viverem felizes sem desconfianças. Céfalo se sentiu feliz em ter novamente a esposa em seus braços. Prócris deu a Céfalo a lança e o cão para que pudesse caçar e passaram a viver em completa felicidade.

Certo dia fazia muito calor e Céfalo pediu: - Vem, brisa suave, vem afagar-me. Sabes quanto te amo! Tu tornas deliciosos
os bosques e minhas caminhadas solitárias!... Alguém, que por acaso ouviu as declarações de Céfalo, foi contar a Prócris que seu marido estava no bosque invocando carinhos em altas vozes e que poderia ser de alguma mulher com quem tinha encontros amorosos, enquanto Prócris supunha que estivesse a caçar. No mesmo instante renasceram as suspeitas e os ciúmes de Prócris.

No dia seguinte, quando seu marido pegou da lança e chamou o cão, Prócris o seguiu secretamente escondendo-se atrás das folhagens para não ser vista. Quando Céfalo ergueu os braços e pediu ao vento que o refrescasse, Prócris inclinou-se para melhor ouvir o que ele dizia. Ela queria saber o nome da sua rival.

No entanto, o ruído nas folhagens chamou a
atenção de Céfalo que, supondo tratar-se de um animal selvagem, arremessou sua lança infalível contra a folhagem de onde vinha o ruído. Com o coração transpassado, Prócris caiu com grito de agonia. Assim morreu a bela esposa de Céfalo, cujo fim foi motivado pela maledicência alheia e pela injustificada desconfiança. Em suas últimas palavras, Prócris suplicou que Céfalo nunca se casasse com a odiosa Brisa...

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O mito de Prócris e Céfalo se relaciona à fidelidade, a bela face do amor que não admite o fingimento, as máscaras e a
dissimulação, porque a infidelidade está na tentativa de enganar o outro. Nada é mais fatal para o amor do que a mentira que gera a desconfiança; a desconfiança que gera o ciúme; o ciúme que gera a briga e a briga que gera a separação.

Quando o amor se torna uma brincadeira de "esconde-esconde", é apenas uma brincadeira de amar, porque o amor
verdadeiro vence qualquer falsidade. A mentira tem pernas curtas, ela logo aparece e quando isto ocorre deixa o mentiroso desqualificado e indigno de confiança. Ser fiel ao outro é saber respeitar, defender e não trair seja por pensamentos ou palavras.

A infidelidade é um dos problemas mais difíceis de ser superado. Ninguém está preparado para enfrentar uma
frustração, por isso muita gente até finge que não vê a traição, para não ter que enfrentar o sofrimento. O problema é que isso vira fantasma guardado no armário, que deteriora a autoestima, a confiança e o relacionamento. Quem é traído passa pelo processo da desilusão, desconfiança, controle do outro, perda da capacidade de amar e sentimento de abandono e rejeição.

Muitas pessoas tendem a buscar a culpa em si mesmas, se indagando se fêz algo errado. Outras, pensam que a culpa é de
terceiros, dos parentes ou de forças invisíveis. Nas relações de emoções explosivas, os casais se agridem e quando se guarda rancor pelas ofensas do outro, uma raiva silenciosa vai querer vingança em algum momento. Em geral acontecem com pessoas inseguras que querem manter o controle sobre o outro.

O amor nunca chega pronto, o amor se constrói junto com a confiança. O amor tudo suporta, tudo crê, tudo espera; o amor não passa jamais. Quando o amor é grande, maior é a vontade de ajudar o outro crescer, um exercício constante que evita que o amor se torne vazio, monótono e sem sabor. E como a natureza tem horror ao vácuo, este vazio será preenchido pelos desentendimentos. As relações em que há acusações mútuas, são relações contaminadas em que ambos querem ter razão. E a razão muitas vezes leva ao fim do relacionamento.

Relações fadadas ao fracasso tem características marcantes: a solidão a dois, a
falta de diálogo, a indiferença, a desqualificação do outro, as brigas pelo controle do dinheiro que na verdade se torna uma questão de poder. E quando a possessividade e o ciúme são marcantes, um boicota os sonhos do outro, trai, frustra e agride. É o caminho rápido para o fim.

2 comentários:

  1. Amei!
    Eu conheci esse mito um pouco diferente. Mas mito é mito. E adorei a sua colocação final. Belo blog!

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  2. Eu vejo este mito de outra forma. O ser humano não abandona suas paixões pessoais e a exigência de fidelidade, portanto de abandoná-las, destrói as relações e os indivíduos. Por isso as pessoas em geral, incapazes de lidar com isso, escondem "seus verdadeiros eus" do seu amado, para possibilitar que continuem se amando...

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